Brasil dá continuidade à sua tradição em Le Mans

História do país na famosa prova de resistência mescla heroísmo, tradição e tragédia

Com uma relevante lista de talentos, o Brasil escreveu seu nome nas 24 Horas de Le Mans de diversas formas. Deste a estreia, em 1935, o país já contou com 34 pilotos na corrida, incluindo diversos jovens promissores e pilotos consagrados. Prova disso é que sua imensa maioria é formada por profissionais contratados por fábricas e equipes para tentar a vitória, e não por gentleman drivers – pilotos com verba pessoal para adquirir uma vaga em equipes subfinanciadas.
No próximo sábado, a partir das 11h (de Brasília), a famosa corrida francesa dá a largada para a sua 89ª edição e terá entre os inscritos seis brasileiros, dois deles tentando a vitória na categoria principal – feito inédito para o país. A prova valerá pela quarta etapa do Campeonato Mundial de Endurance (WEC).
Entre os representantes do Brasil, o mais graduado é André Negrão, piloto da equipe Alpine, na qual divide o cockpit com os franceses Nicolas Lapierre e Matthieu Vaxivière. Bicampeão da prova em 2018 e 2019 na categoria LMP2, a segunda da hierarquia do WEC, André tentará vencer na classificação geral, mesmo objetivo de Pipo Derani, que estará a bordo de um novo carro, o americano Glickenhaus SCG 007, ao lado dos pilotos franceses Franck Mailleux e Olivier Pla. Ambos disputam a categoria principal, a Hypercars, criada para atrair as fábricas em uma bem-sucedida jogada do WEC.

”Le Mans é o troféu máximo” – “É curioso como a minha carreira me trouxe até aqui, até esta prova. Eu, como todo brasileiro, sonhava com a Fórmula 1, mas foi aqui, no campeonato de endurance, que eu me achei. E por isso Le Mans, nossa prova mais difícil, é o troféu máximo que eu poderia almejar”, diz André Negrão. “Durante o ano, todo o nosso trabalho é voltado para essas 24 horas. Aqui é o tudo ou nada. Só de estar lá já é um grande momento na vida de um piloto. Já vi muita gente chorando como criança só por completar a prova. Isso diz muito sobre Le Mans”, completa Negrão, que foi campeão mundial de endurance na supertemporada 2018/2019.
Os campeões de Stock Car Daniel Serra, Felipe Fraga e Marcos Gomes foram contratados para tentar a vitória por equipes das categorias GT, ou seja, que utilizam os mais sofisticados super esportivos encontrados nas lojas – mas com preparação especial. Serra utilizará uma Ferrari 488 GTE EVO da equipe oficial da marca italiana, a Ferrari AF Corse. Felipe Fraga estará ao volante de um Aston Martin Vantage AMR da TF Sport. E Gomes pilotará o Aston Martin Vantage AMR da equipe oficial Aston Martin Racing.
O sexto nome é a confirmação mais recente no esquadrão de brasileiros: o ex-piloto de Fórmula 1 Felipe Nasr reforçará a equipe italiana Risi Competizione como parceiro dos britânicos Ryan Cullen e Oliver Jarvis. Nasr tentará seu primeiro título em Le Mans na categoria LMP2, a bordo de um protótipo Oreca 07 equipado com motor Gibson.
Serra venceu Le Mans duas vezes, em 2017 e 2019, ambas na categoria LMGTE-Pro. Já Fraga foi campeão em 2019 na LMGTE-Am, mas perdeu o título por um erro da equipe no reabastecimento do carro. Gomes é a segunda geração da família a disputar uma prova em Le Mans. Em 1978, seu pai, o também campeão de Stock Car Paulo Gomes, dividiu a pilotagem de um Porsche 935/77 com outros dois brasileiros lendários e no auge de seus talentos: Alfredo Guaraná Menezes e Marinho Amaral. O trio terminou em segundo na categoria Grupo 5, sendo o sétimo carro na classificação geral.
Desde 1935, com a estreia de Bernardo Souza Dantas, o melhor resultado de um brasileiro na classificação geral em Le Mans foi o segundo lugar, com José Carlos Pace (Ferrari, edição de 1973), Raul Boesel (Jaguar, 1991), Lucas Di Grassi (Audi, 2014) e Bruno Senna (protótipo LMP1, 2020). Com três pódios na categoria principal, Di Grassi é o mais bem sucedido.

Riscos na pista de rua – Mas houve momentos de tristeza também. Por utilizar ruas comuns em seu traçado, Le Mans sempre ofereceu riscos extras devido aos obstáculos urbanos, como muros e postes. Em 1960, Fritz D’Orey foi contratado pela Ferrari para disputar a prova, mas sofreu um sério acidente. Seu carro partiu-se no meio depois de bater contra uma árvore, causando lesões graves, incluindo traumatismo craniano. Depois de oito meses recuperação, o jovem de 22 anos teve sua carreira interrompida.
Três anos mais tarde, Christian Heinz, o “Bino”, liderava sua categoria e estava em terceiro na classificação geral com um Alpine M63 quando seu carro chocou-se contra um poste, causando um incêndio. Heinz faleceu na hora, ainda aos 28 anos de idade. Em 2006, um outro Christian representaria o Brasil em Le Mans. Filho de Wilsinho e sobrinho de Emerson Fittipaldi, Christian Fittipaldi foi batizado em homenagem a Bino, um piloto reconhecido pelo talento e pioneirismo pelos colegas de pista que havia deixado no Brasil.

Piloto – Ano de participação
1 – Bernardo Souza Dantas – 1935
2 – Hermano da Silva Ramos – 1954, 1956 e 1959
3 – Christian Heinz – 1959 e 1963
4 – Fritz D’Orey – 1960
5 – José Carlos Pace – 1973
6 – Paulo Gomes – 1978
7 – Marinho Amaral – 1978
8 – Alfredo Guaraná Menezes – 1978
9 – Roberto Moreno – 1984
10 – Raul Boesel – 1987, 1988, 1991
11 – Maurizio Sandro Sala – 1989, 1990, 1991, 1992, 1995, 1996
12 – Antonio Hermann de Azevedo – 1993, 1994,1995, 1996, 1997
13 – Thomas Erdos – 1995, 1996, 1997, 1999, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008, 2009, 2010 e 2011
14 – Nelson Piquet – 1996 e 1997
15 – André Lara Rezende – 1997
16 – Ricardo Zonta – 1998 e 2008
17 – Jaime Melo – 2004, 2007, 2009, 2010, 2011 e 2012
18 – Nelson Piquet Jr. – 2006, 2016 e 2017
19 – Christian Fittipaldi – 2006, 2007 e 2008
20 – Alexandre Negrão – 2008
21 – Bruno Senna – 2009, 2013, 2014, 2016, 2017, 2018, 2019 e 2020
22 – Augusto Farfus – 2010, 2011, 2018, 2019 e 2020
23 – Lucas Di Grassi – 2013, 2014, 2015 e 2016
24 – Fernando Rees – 2014, 2015, 2016 e 2017
25 – Pipo Derani – 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019
26 – Oswaldo Negri Jr. – 2016 e 2020
27 – Rubens Barrichello – 2017
28 – Tony Kanaan – 2017 e 2018
29 – André Negrão – 2017, 2018, 2019 e 2020
30 – Daniel Serra – 2017, 2018, 2019 e 2020
31 – Felipe Nasr – 2018
32 – Rodrigo Baptista – 2019
33 – Felipe Fraga – 2019 e 2020
34 – Marcos Gomes – 2020

Brasil na 24 Horas de Le Mans 2021
Piloto / Categoria / Carro / Equipe
André Negrão / Hypercars / Alpine A480 / Alpine Elf Matmut
Pipo Derani / Hypercars / Glickenhaus SCG 007 / Scuderia Cameron Glickenhaus
Felipe Nasr / LMP2 / Oreca 07-Gibson / Risi Competizione
Daniel Serra / LMGTE-Pro / Ferrari 488 GTE EVO / Ferrari AF Corse
Marcos Gomes / LMGTE-Am / Aston Martin Vantage AMR / Aston Martin Racing
Felipe Fraga / LMGTE-Am / Aston Martin Vantage AMR / TF Sport

Foto: François Flamand/DPPI

Por: Rodolpho Siqueira

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